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terça-feira, 16 de setembro de 2014


DELAÇÃO PREMIADA
Um prêmio acumulado


Ele chegou ao departamento da polícia especializado em corrupção em grandes estatais. Entrou na fila das denúncias, aguardou sua vez. Duas horas depois, o número da sua senha piscou no monitor. Estava acompanhado de dois seguranças. Sua denúncia era coisa grave. Muito grave. Não apenas mais um escândalo, mas “o escândalo”.
 
- Boa tarde, senhor. Em que posso ajudar?

- Eu quero me entregar. Quer dizer, quero entregar umas centenas de parlamentares, juízes, governadores, vereadores e prefeitos. Em troca, o prêmio pela delação. Se possível, um asilo na Suíça.

- Claro, claro... O senhor trouxe uma cópia do CPF?
 
O delator tinha declarado em seu blog que não haveria mais eleições, caso denunciasse o que sabia. O atendente perguntou:
 
- Não haverá eleições neste ano?

- Neste ano e nos outros. Nunca mais.
 
Um pouco surpreso, o policial-atendente levantou as pestanas, arrumou os óculos no rosto. Retirou-se e voltou com o chefe da repartição. Momento de perplexidade. Tenso.
 
O depoimento avançou sobre o resto do expediente. O horário terminou, mas continuaram noite a dentro. A lista dos denunciados se alongava – incluía assessores, auxiliares administrativos, porteiros, ascensoristas, um guardador de automóveis do estacionamento em frente ao prédio e um vendedor de amendoim da calçada. O cartucho da impressora teve que ser trocado três vezes.
 
Ao fim, como prêmio pela delação, o denunciante ganhou liberdade total, mesmo tendo confessado a participação no rombo milionário em nessa importante empresa estatal – a maior do país.
 
E mais: o diretor do departamento policial lhe assegurou que ele passaria a ter um crédito com a justiça, poderia cometer o crime que quisesse, de qualquer tipo, tamanho o peso do escândalo.
 
Certamente apenas mais um a ser esquecido e arquivado.
 
 

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