DELAÇÃO
PREMIADA
Um prêmio acumulado
Ele chegou ao departamento da polícia
especializado em corrupção em grandes estatais. Entrou na fila das denúncias,
aguardou sua vez. Duas horas depois, o número da sua senha piscou no monitor.
Estava acompanhado de dois seguranças. Sua denúncia era coisa grave. Muito
grave. Não apenas mais um escândalo, mas “o escândalo”.
- Boa tarde, senhor. Em que posso ajudar?
- Eu quero me entregar. Quer dizer, quero
entregar umas centenas de parlamentares, juízes, governadores, vereadores e
prefeitos. Em troca, o prêmio pela delação. Se possível, um asilo na Suíça.
- Claro, claro... O senhor trouxe uma cópia
do CPF?
O delator tinha declarado em seu blog que não
haveria mais eleições, caso denunciasse o que sabia. O atendente perguntou:
- Não haverá eleições neste ano?
- Neste ano e nos outros. Nunca mais.
Um pouco surpreso, o policial-atendente
levantou as pestanas, arrumou os óculos no rosto. Retirou-se e voltou com o
chefe da repartição. Momento de perplexidade. Tenso.
O depoimento avançou sobre o resto do
expediente. O horário terminou, mas continuaram noite a dentro. A lista dos
denunciados se alongava – incluía assessores, auxiliares administrativos,
porteiros, ascensoristas, um guardador de automóveis do estacionamento em
frente ao prédio e um vendedor de amendoim da calçada. O cartucho da impressora
teve que ser trocado três vezes.
Ao fim, como prêmio pela delação, o
denunciante ganhou liberdade total, mesmo tendo confessado a participação no rombo
milionário em nessa importante empresa estatal – a maior do país.
E mais: o diretor do departamento policial
lhe assegurou que ele passaria a ter um crédito com a justiça, poderia cometer
o crime que quisesse, de qualquer tipo, tamanho o peso do escândalo.
Certamente apenas mais um a ser esquecido e
arquivado.
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